O REINO DE GABU: ASCENSÃO E DECLÍNIO

Reino de Gabu c.1625 

O reino Kaabu (1537-1867), também escrito Gabu, Ngabou, e N'Gabu, foi um reino na região da Senegâmbia centrado no nordeste moderno da Guiné-Bissau, maiores partes da atual Gâmbia; estendendo-se até Koussanar, Koumpentoum, regiões do sudeste do Senegal e Casamance no Senegal. O reino Kaabu consistia de várias línguas, a saber: Balanta, Jola-Fonyi, Mandinka, Mandjak, Mankanya, Noon (Serer-Noon), Pulaar, Serer, Soninke e Wolof. Ganhou destaque na região graças às suas origens como uma antiga província militar imperial do Império Mali. Após o declínio do Império Mali, Kaabu tornou-se um Império independente. Kansala, a capital imperial de Kaabu, foi anexada por Futa Jallon durante as jihads fula do século 19.

A ascensão do Reino de Gabu na região deveu-se às suas origens como antiga província do Império do Mali. Após o declínio do Império do Mali, Gabu tornou-se um reino independente. Sua capital era Cansalá, que atualmente corresponde à vila-seção de Camalija Durbali, no setor de Pirada, na Guiné-Bissau. As quatro principais cidades do império eram Canquelifá (Kankelefa), Gabunto (Kabintum), Cansalá (Kansala) e Samaracunda (Samakantentensuto). As três primeiras eram as principais cidades natais do clã dos mansas que governaram o Reino de Gabu durante esse período.

Os mandingas chegaram à região da atual Guiné-Bissau por volta do ano 1200. Um dos generais de Sundiata Queita, Tiramacã Traoré, conquistou a área, fundando muitas novas cidades e tornando Gabu um dos tincuru (ou províncias) ocidentais do Império do Mali na década de 1230. No início do século XIV, grande parte da Guiné-Bissau estava sob o controle do Império do Mali e governada por um Farim Gabu (comandante de Gabu) leal ao mansa do Mali. Em meados do século XIV, o Mali viu um declínio acentuado devido às invasões dos mossis ao sul e ao crescimento do novo Império Songai. Durante o século XVI, o Mali perdeu muitas de suas províncias, reduzindo-o a não muito mais do que a zona original dos mandingas. As disputas de sucessão entre herdeiros do trono do Mali também enfraqueceram sua capacidade de manter até mesmo suas posses historicamente seguras no Senegal, Gâmbia e Guiné-Bissau.

 

Origens e Ascensão


As origens do Império de Gabu remontam ao século XIII, quando os mandingas migraram para a região oriental da atual Guiné-Bissau. Os mandingas eram um povo de língua mandê que habitava principalmente a região do alto rio Níger. Com o tempo, eles se expandiram para o oeste, estabelecendo assentamentos na região que se tornaria o Império de Gabu.

Essas migrações foram impulsionadas por uma variedade de fatores, incluindo pressões demográficas, busca por terras férteis para a agricultura e comércio. Os mandingas eram conhecidos por sua habilidade como agricultores e comerciantes, e sua presença na região contribuiu para o desenvolvimento de assentamentos urbanos e rotas comerciais.

À medida que os mandingas se estabeleciam na região, eles começaram a formar estruturas políticas e sociais mais complexas, eventualmente levando à criação do Império de Gabu. O surgimento do império foi influenciado por contatos com outros estados da África Ocidental, bem como com os europeus, que estavam começando a explorar a costa oeste africana em busca de rotas comerciais para o ouro e outros recursos.

Mapa com as referências do território mandinga 

Ao longo do tempo, o Império de Gabu cresceu em poder e influência, tornando-se um importante centro regional de comércio e cultura. Sua localização estratégica, recursos naturais e habilidades comerciais contribuíram para seu sucesso e expansão ao longo dos séculos XVI e XVII, quando alcançou seu auge como uma potência política na África Ocidental.

Expandindo-se a partir da zona de Mandé, no atual Mali, e parte da Guiné-Conacri, os governantes do Reino de Gabu acreditavam que seu direito de governar vinha de sua história como província imperial. Os reis do Gabu independente descartaram o título de Farim Gabu e assumiram o de Gabu Mansaba.

O reino deveu sua ascensão à sua origem como antiga província do Império do Mali. Um dos generais de Sundiata Queita, Tiramacã Traoré, conquistou a área, fundando muitas novas cidades e tornando Gabu um dos tincuru (ou províncias) ocidentais do Império do Mali na década de 1230. No início do século XIV, grande parte da Guiné-Bissau estava sob o controle do Império do Mali e governada por um Farim Gabu (comandante de Gabu) leal ao mansa do Mali.

O reino de Gabu manteve sua capital em Cansalá, que atualmente corresponde à vila-seção de Camalija Durbali, no setor de Pirada, na Guiné-Bissau. As quatro principais cidades do império eram Canquelifá (Kankelefa), Gabunto (Kabintum), Cansalá (Kansala) e Samaracunda (Samakantentensuto). Apesar de seu declínio posterior, o Reino de Gabu desempenhou um papel significativo na história da região e na interação entre diferentes povos e culturas.

 

Relações com o resto da África


O Império de Gabu teve relações significativas com o resto da África, especialmente com outros estados e povos da África Ocidental, Gabu era um importante centro comercial na África Ocidental. Estabeleceu rotas comerciais que se estendiam para o interior, permitindo o comércio de ouro, marfim, escravos e outros produtos com estados vizinhos, como Mali, Songhai, Fouta Djallon e os reinos da região do Senegal. Através do comércio e intercâmbio cultural, Gabu foi influenciado por outras culturas da África Ocidental. Isso incluiu o compartilhamento de práticas religiosas, tradições artísticas e tecnologias, bem como o desenvolvimento de relações diplomáticas e alianças.

Enquanto a religião predominante em Gabu era tradicionalmente animista, com a crença em espíritos e divindades da natureza, houve também influências do islamismo. O comércio trouxe contatos com povos muçulmanos, levando à conversão de algumas populações e à adoção de elementos islâmicos na cultura e na sociedade de Gabu.

O reino de Gabu frequentemente formava alianças com outro estados da África Ocidental para fortalecer sua posição política e econômica na região. No entanto, também houve conflitos e rivalidades com estados vizinhos, especialmente por questões territoriais, controle de rotas comerciais e recursos naturais. Além do comércio de bens materiais, as trocas culturais foram uma parte importante das relações de Gabu com o resto da África. Isso incluiu o intercâmbio de músicas, danças, arte, tecnologias e conhecimentos entre diferentes grupos étnicos e estados da região, essas interações ajudaram a moldar a história e o desenvolvimento tanto de Gabu quanto da África Ocidental como um todo.

 

 Economia e comércio


O Reino de Gabu tinha uma economia e cultura distintas durante seu período de existência. A economia de Gabu era baseada principalmente na agricultura. Os habitantes cultivavam milhete, sorgo, arroz, amendoim e algodão. Essas colheitas forneciam alimentos para a população e também eram usadas para fins comerciais, Gabu estava estrategicamente localizado entre o Império do Mali e as rotas comerciais costeiras. Isso permitia que o reino participasse do comércio transsaariano, trocando ouro, sal e outros produtos com caravanas que atravessavam a região. Gabu também tinha minas de ouro e sal, que eram importantes para sua economia. O ouro era especialmente valioso e era usado para pagar tributos e sustentar a corte real.


Sociedade e Cultura

O chefe da tabanca, com o traje usado durante o período do Ramadão: usa ao peito um colar de prata, trabalho que só podia ser de ourives mandinga: há várias teorias sobre a funcção da caixinha.


A sociedade de Gabu era organizada em clãs e castas. Os mandingas eram a classe dominante, mas havia também outros grupos que viviam na região antes da chegada dos mandingas, o manso (rei) governava o reino, e sua autoridade era hereditária. Os farins (comandantes) administravam as províncias e cidades.

A língua predominante em Gabu era o mandinga, que também era usado nas cortes reais. A religião era uma mistura de crenças nativas africanas e islamismo, trazido por comerciantes e estudiosos muçulmanos. Gabu tinha uma rica tradição oral, com histórias, lendas e poesia transmitidas de geração em geração. A arte incluía esculturas em madeira, cerâmica e tecelagem, a sociedade de Gabu era estratificada. O mansa (rei) era o líder supremo, seguido pelos nobres, comerciantes, agricultores e artesãos. A nobreza tinha grande influência na corte e na tomada de decisões. As pessoas em Gabu usavam roupas de algodão e adornos como colares, pulseiras e anéis, a moda e os adornos eram símbolos de status e identidade.

O ensino corânico tradicional em Gabu começou em 1878, durante a chamada Guerra de Cansalã na região leste do país. Os Fulas obrigaram os perdedores da guerra, os mandingas (donos da terra), a se converterem ao Islã. Estudiosos do Alcorão Fulas vindos da República da Guiné começaram a ensinar o Alcorão nas mesquitas em várias cidades da Região Leste, incluindo Gabu. Assim, iniciava-se o processo de islamização dos povos habitantes da região de Gabu, não apenas pela dominação política, mas também religiosa.

A educação corânica constitui um sistema alternativo ou paralelo ao sistema oficial de educação formal na Guiné. Esse sistema de ensino baseia-se na aprendizagem do Alcorão. Apesar de se fundar na transmissão escrita, devido à importância primordial dada ao Alcorão, a transmissão do conhecimento nessas escolas deve-se à tradição oral, sendo tributária da memória e da escuta. O Islã professado pelas populações locais é uma religião viva.

O sistema de escrita utilizado nas escolas corânicas tradicionais em Gabu é principalmente baseado na tradição oral. Embora o Alcorão seja escrito, a transmissão do conhecimento ocorre principalmente por meio da memória e da escuta. A importância dada ao Alcorão torna a tradição oral uma parte vital do processo educativo. Além disso, o sistema de escrita oficial na Guiné utiliza o alfabeto latino para a língua oficial, mas nas escolas corânicas, o foco está na memorização e recitação do Alcorão em árabe.

 

A arte e a sua influência

Assim como em outras culturas africanas, a escultura em terracota era uma forma de arte proeminente em Gabu. Esculturas em terracota retratavam figuras humanas, animais e divindades em formas realistas e estilizadas. As cabeças humanas esculpidas em terracota são exemplos notáveis, muitas vezes retratando características faciais detalhadas e expressivas. A metalurgia também era praticada em Gabu, e artefatos em metal, como joias, utensílios domésticos e armas, eram produzidos na região. Estes artefatos exibiam habilidades técnicas e estéticas, com designs elaborados e padrões decorativos.

Espada antiga com bainha em pele ricamente decorada, do fim do século XIX, pertencentes ao povo Mandinga.

Na sociedade gabunense, os artesãos e artistas desempenhavam papéis essenciais, contribuindo para a riqueza cultural e o funcionamento do reino. Os artesãos eram habilidosos na produção de bens essenciais para a vida cotidiana. Eles criavam objetos como utensílios de cerâmica, cestas, tecidos, instrumentos musicais, armas e adornos. Os produtos artesanais eram frequentemente comercializados dentro e fora do reino. Os artesãos contribuíam para a economia local, trocando seus produtos por outros bens ou moedas, através de suas habilidades, os artesãos preservavam tradições culturais e técnicas ancestrais. Suas criações refletiam a identidade e os valores da sociedade gabunense. Os artistas em Gabu eram responsáveis por expressar a cultura, a espiritualidade e as histórias do povo. Eles usavam várias formas de arte, como escultura, pintura, dança, música e poesia.

Escultores habilidosos criavam estátuas, máscaras e relevos em madeira. Essas obras muitas vezes tinham significados religiosos ou cerimoniais, os artistas musicais e dançarinos animavam festivais, cerimônias e celebrações. A música e a dança eram parte integrante da vida social e espiritual,os poetas e contadores de histórias transmitiam a história oral do reino. Suas palavras celebravam heróis, eventos importantes e valores culturais.

 

Sítios Arqueológicos:

A região onde Gabu existiu contém sítios arqueológicos que revelam vestígios da antiga civilização, esses sítios incluem ruínas de cidades, túmulos, estruturas de habitação e objetos manufaturados. Escavações arqueológicas em áreas como Cansalá (antiga capital de Gabu) podem fornecer insights sobre a vida cotidiana, a economia e a cultura do reino, registros históricos, crônicas e documentos escritos mencionam o Reino de Gabu, essas fontes incluem relatos de viajantes, comerciantes, exploradores e historiadores da época. Os griôs (contadores de histórias) também transmitiram a história oral do reino, preservando-a através de gerações. Muitas tradições culturais e práticas do Reino de Gabu foram transmitidas oralmente, danças, músicas, cerimônias religiosas e rituais refletem a herança cultural do reino. A tradição oral é uma fonte valiosa para entender a sociedade, a religião e as relações sociais em Gabu. Embora o Reino de Gabu não exista mais como uma entidade política, suas evidências arqueológicas, fontes escritas e tradições culturais nos permitem reconstruir parte de sua história e compreender sua importância na região da Senegâmbia e além.

 

Declínio e Legado


De acordo com a tradição mandinga, Gabu existia e permaneceu invicto por oitocentos e sete anos. Foram 47 mansas em sucessões. O poder de Gabu começou a diminuir durante os séculos XVIII e XIX quando líderes islâmicos militantes entre o povo Fula, com a ajuda de alguns chefes sonincas e mandingas, se reuniram contra estados não-muçulmanos na região. Isso culminou em 1865 em uma jiade regional liderada pelo Imamato de Futa Jalom, conhecido como Turbã Quelo ou Guerra de Cansalá. Antes disso, Gabu havia repelido com sucesso em várias ocasiões vários exércitos no forte de Berecolongue.

O colapso do Império de Gabu começou a ocorrer nos séculos XVIII e XIX, principalmente devido a uma combinação de fatores internos e externos, Gabu enfrentou pressão de estados vizinhos e grupos rivais. Conflitos territoriais, disputas de fronteiras e rivalidades políticas enfraqueceram a estabilidade do império e minaram sua capacidade de se defender de ameaças externas.

O comércio de escravos transatlântico teve um impacto devastador sobre a população e a economia de Gabu. O tráfico de escravos reduziu a população local, desestabilizou comunidades e interrompeu as atividades econômicas tradicionais, como a agricultura e o comércio. O avanço de povos vizinhos, como os Fulani, também contribuiu para o colapso de Gabu. Invasões e ataques militares enfraqueceram as defesas do império e levaram à perda de território e poder político.

O declínio do comércio de ouro, o esgotamento dos recursos naturais e a interrupção das rotas comerciais também contribuíram para o declínio econômico de Gabu. Isso reduziu a capacidade do império de sustentar sua população e manter sua autoridade sobre as regiões vizinhas.


Gabú, Guinea-Bissau, tempos atuais 

O legado de Gabu perdura até os dias atuais, apesar de seu colapso, o reino deixou um legado cultural significativo, incluindo sua arte em terracota, tecidos, metalurgia e outras formas de expressão cultural. Essas tradições continuam a influenciar a arte e a cultura da região.Os vestígios arqueológicos e históricos do Império de Gabu são testemunhos de sua antiga glória e importância. Sítios arqueológicos, como esculturas em terracota e ruínas de cidades antigas, preservam a história e a memória do império para as gerações futuras.

O Império de Gabu desempenhou um papel na formação da identidade nacional da Guiné-Bissau e de outros países da região. Sua história e legado são parte integrante da narrativa nacional e do orgulho cultural das pessoas da região.

 

Sugestões de leitura:

  • Hrbek, I. (Ed.). (1992). História Geral da África, Volume IV: África do século XII ao século XVI. Imprensa da Universidade da Califórnia.
  • Boubacar, B. (2001). "Os impérios da África Ocidental Medieval: Gana, Mali e Songhay". Publicações da Chelsea House.
  • Wilks, I. (1995). "Florestas de Ouro: Ensaios sobre os Akan e o Reino de Asante". Imprensa da Universidade de Ohio.
  • Oliver, R. e Atmore, A. (2001). “África Medieval, 1250-1800”. Cambridge University Press.
  • Thornton, J. (1999). "África e os africanos na construção do mundo atlântico, 1400-1680". Cambridge University Press.

 

 Uma África Desconhecida

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