HIPOPÓTAMOS NO SAARA: UMA JORNADA ATRAVÉS DO TEMPO

Arte na Caverna das Feras , Wadi Sura II, Deserto Ocidental, Egito, via Universidade de Colônia

 

O que vem à sua mente quando você ouve falar do Deserto do Saara? 3,6 milhões de quilómetros de areia que se estendem desde o Mar Vermelho, no Egipto, até ao Oceano Atlântico, em Marrocos, o deserto do saara é uma vasta extensão árida. Mas esta região nem sempre foi tão seca e árida. No passado, o Deserto do Saara estava repleto de vida. As alterações climáticas podem parecer algo novo. No entanto, o registo geológico e a arte pré-histórica africana mostram-nos que existe uma mudança climática que é inevitável e muitas vezes não tem nada a ver com as actividades modernas do homem.

O Saara, um dos maiores desertos do mundo, é conhecido por sua vastidão árida e paisagens desoladas. No entanto, uma história surpreendente e muitas vezes esquecida emerge quando exploramos os vestígios do passado pré-histórico deste deserto implacável. Entre as descobertas mais intrigantes está a presença de hipopótamos, animais que hoje associamos a ambientes aquáticos, vagando pelas terras secas do Saara em tempos ancestrais. Neste artigo, exploraremos a existência desses animais no Saara, as mudanças climáticas que moldaram esse ambiente e como a arte rupestre pré-histórica nos oferece um vislumbre desse mundo perdido.

 

Hipopótamos no Saara

 

Os hipopótamos, conhecidos por sua adaptação à vida aquática, podem parecer fora de lugar no ambiente seco do Saara. No entanto, evidências fósseis indicam que esses animais uma vez habitaram a região. Restos de hipopótamos foram encontrados em sítios arqueológicos no Saara, revelando que, em tempos pré-históricos, rios e lagos eram mais abundantes na região, proporcionando habitat para esses animais.

Uma das evidências mais impressionantes da presença histórica de hipopótamos no Saara são as pinturas rupestres encontradas em várias partes do deserto. Essas pinturas, algumas datadas de milhares de anos atrás, retratam cenas da vida cotidiana dos antigos habitantes do Saara, incluindo caçadas, atividades de pastoreio e, surpreendentemente, imagens de hipopótamos.

As pinturas rupestres que retratam hipopótamos fornecem insights valiosos sobre a ecologia e o ambiente do Saara pré-histórico. Elas sugerem que, em tempos antigos, rios e lagos eram mais abundantes na região, proporcionando habitat adequado para esses animais. Além disso, as pinturas também indicam que os antigos habitantes do Saara tinham uma relação significativa com a vida selvagem ao seu redor, incorporando-a em sua arte e cultura.

Essas pinturas rupestres não apenas nos conectam ao passado distante do Saara, mas também nos lembram da importância de preservar e proteger o patrimônio cultural e natural da região. Elas são testemunhos silenciosos de um tempo em que o Saara era muito diferente do que é hoje, e nos desafiam a refletir sobre as mudanças ambientais que ocorreram ao longo dos milênios

 

Mudanças Climáticas

 

Pintura rupestre, Período Pastorício (com camelos adicionados num período posterior), na gruta de Manda Guéli, nas Montanhas Ennedi no Chade.

 

A mudança no clima é acentuada quando se trata do Norte de África. Originalmente, era muito árido. Quando a Idade do Gelo começou, há cerca de 30 mil anos, formaram-se glaciares nas terras altas africanas da Etiópia, Uganda e Quénia. Quando estes começaram a derreter, há 12 mil anos, grandes quantidades de água fluíram do Lago Vitória e desceram pelo Nilo Azul e Branco. Eles inundaram o Vale do Nilo, no Egito, e teriam levado embora quaisquer vestígios arqueológicos.

O Saara era desabitado há 11.000 anos, pois o clima era ainda mais árido do que é hoje. O clima ficou mais úmido há 10.000 a 6.000 anos, com as chuvas das monções de verão. A vida selvagem e as plantas floresceram num ambiente de savana, com rios sazonais e zonas húmidas. Estes, juntamente com as pastagens, teriam sido o lar de uma variedade de vida selvagem semelhante à que é encontrada hoje em outras partes de África, como hipopótamos, burros, elefantes peixes, girafas, avestruzes, antílopes e gazelas. Os caçadores-coletores ocupavam esta área, deslocando-se grandes distâncias para se sustentar e apenas estabelecendo-se sazonalmente em oásis.

Há cerca de 7.000 anos, os habitantes da região começaram a pastorear gado. Enquanto procuravam pastagens, deixaram pinturas rupestres pelo deserto documentando as origens da domesticação. O gado costuma ter corpos decorados e usar colares com pingentes. Cenas de ordenha também são encontradas. Cerca de 6.000 anos atrás, as chuvas das monções de verão foram substituídas pelas chuvas noturnas de inverno, o que levou a um ambiente mais árido. À medida que a dessecação avançava, a criação de ovelhas e cabras se estabeleceu.

As mudanças climáticas desempenharam um papel fundamental na transformação do Saara ao longo dos milênios. Durante o período do Holoceno, há cerca de 12.000 anos, o Saara passou por uma transição drástica de um ambiente úmido e verde para um deserto árido. Essa mudança foi causada por uma combinação de fatores, incluindo variações na órbita da Terra, padrões de circulação atmosférica e atividades humanas.

 

 Arte Rupestre Pré-histórica

 

Pinturas rupestres, deserto oriental do Egito

As pinturas rupestres encontradas em todo o Saara fornecem pistas valiosas sobre o ambiente e a vida pré-histórica na região. Entre essas pinturas estão representações de hipopótamos, sugerindo que esses animais desempenharam um papel significativo na vida e na cultura dos antigos habitantes do Saara. As pinturas também retratam outros aspectos da vida cotidiana, incluindo caçadas, rituais e interações sociais.

Eventualmente, a população humana começou a se estabelecer no Vale do Nilo e deixou uma grande quantidade de arte rupestre egípcia pré-histórica que data deste período (correspondendo aos períodos Nagada I e II na área a oeste do Nilo entre Qena e Kom Ombo). Aqui descobrimos que além de arcos e flechas, os caçadores usavam cães e laços para capturar suas presas. A caça provavelmente teria sido uma actividade de elite nesta altura, uma vez que apenas 1% da carne consumida nesta altura vinha da caça.

 

Petróglifo representando um antílope possivelmente adormecido, localizado em Tin Taghirt, no Tassili n’Ajjer. Crédito: Linus Wolf/Wikimedia

Conclusão

A presença de hipopótamos no Saara durante a pré-história nos lembra da natureza dinâmica e em constante mudança de nosso planeta. Esses animais, uma vez tão abundantes na região, são testemunhas silenciosas das transformações climáticas que moldaram o deserto ao longo dos milênios. A arte rupestre pré-histórica nos oferece uma janela para esse mundo perdido, destacando a rica e complexa relação entre os seres humanos e o ambiente natural. Ao explorar essas descobertas, somos lembrados da importância de preservar e proteger tanto o patrimônio cultural quanto o natural do Saara, garantindo que as gerações futuras possam continuar a aprender com o passado pré-histórico deste deserto intrigante.

 

Fontes de Pesquisa:

  • National Geographic: Hippos Once Roamed the Sahara. Here's How They Got There
  • Smithsonian Magazine: How the Sahara Desert Was Made
  • UNESCO World Heritage Centre: "Rock Art of the Tadrart Acacus"
  • Climate.gov: "Holocene Epoch: The Age of Humans

Uma África Desconhecida

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Comentários

  1. Quando os continentes se aglutinaram para formar a Pangeia essa área da África ficou no centro da Pangeia. Devido o tamanho da Pangeia o centro se tornou a região mais árida.

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