O FIM DO IMPÉRIO SONGHAI DE SUNNI ALI BER

Askia Muhammed Toure. Pintura de Leo Dillon para uma série patrocinada pela Anheuser-Busch de pinturas de grandes líderes africanos.


O Império Songhai foi um dos grandes impérios da África Ocidental, e seu declínio marcou um momento significativo na história da região. Em 12 de abril de 1591, ocorreu a Batalha de Tondibi, perto do rio Níger.Nessa batalha, uma expedição marroquina liderada pelo paxá Djudar derrotou o exército Songhai. A cavalaria Songhai foi massacrada pelas armas de fogo dos marroquinos. Esse evento marcou o fim do poderoso Império Songhai. Após a derrota em Tondibi, o Império Songhai desmoronou e nunca mais se reergueu.

Ao fim de longa evolução de cerca de oito séculos, os songhai, estabelecidos nas duas margens do rio Níger erigiram um poderoso Estado e unificaram grande parte do Sudão, permitindo o desabrochar de brilhante civilização. No início do século VIII, fundaram Gao, a capital do Estado songhai que logo prosperou graças ao comércio transaariano servindo como ponto de passagem de importante rotas provenientes do Marrocos, Egito e o que hoje corresponde à Tunísia, tendo também conexão com a região das florestas, ao sul. A cidade servia, assim, de ponto de ligação entre o mundo mediterrâneo e a África a sul do saara.

No mercado de Gao negociava-se sal, ouro, âmbar, goma-arábica, peles de leopardos e outras especiarias. Em troca dessas exportações, o Songhai recebia do Marrocos produtos manufaturados: joias, tecidos, espelhos, objetos de couro, trigo, cavalos etc. Não muito longe dali, Tombuctu (ou Timbuctu), fundada pelos tuaregues por volta de 1100, era outro importante centro do comércio transaariano, ponto de encontro de caravanas, além de importante centro religioso e intelectual. Evento de importância capital, foi a conversão do soberano songhai ao Islã em 1019 o que estreitou os laços com a África islâmica. A população, contudo, permaneceu fiel às suas crenças e práticas religiosas tradicionais. Por volta do ano 1300, o Songhai passou para o controle do império de Mali como reino tributário. O mansa Kanku Mussá (1312-1337), soberano de Mali, construiu uma mesquita em Gao.

 

A morte de Sunni Ali Ber e ascensão de Askia Muhamad

Após a morte de Sunni Ali Ber, o império se viu mergulhado em disputas e conflitos até ser novamente centralizado por Askia Muhamad, o Grande (1493-1528), de origem soninke que deu início a uma nova dinastia muçulmana. Apesar de iletrado, era muçulmano fervoroso e político sagaz. Askia alinhou-se firmemente com os habitantes das cidades islâmicas, especialmente os estudiosos de Tombuctu, e isso levou tanto a um florescimento da literatura e dos escritos históricos quanto a uma burocracia poderosa e bem treinada para o seu reino. Askia consolidou o império fundado por Soni Ali expandindo-o a seus limites máximos que abrangia as regiões dos actuais Mali, Níger, Senegal, Guiné, Gâmbia e Burkina Faso, totalizando 1,4 milhão de km².  Estendeu as fronteiras do império estendiam-se ao norte através do deserto até as minas de sal de Taghaza, trazendo ambas as extremidades da rede de comércio transsaariano sob seu controle. Embora fosse um muçulmano devoto, não forçou a islamização da população nem dos povos dominados. Essa diplomacia garantiu-lhe alianças bem escolhidas e tratados negociados de forma inteligente.

Tombuctu, apelidada de “cidade dos 333 santos”, foi capital intelectual e religiosa, e centro de difusão do islamismo na África subsaariana nos séculos XV e XVI.

 

Tondibi e as causas da queda do império Songhai

 No norte do continente africano, o sultanato Saadiano, no Marrocos, estava no auge do seu poder. Em 4 de agosto de 1578, as forças do sultão marroquino, à frente de 50 mil homens haviam vencido as tropas portuguesas com 16 mil homens comandadas pelo rei D. Sebastião, em Alcácer-Quibir. A vitória, porém, esgotou do país deixando o Marrocos à beira da falência. Em busca de novos recursos para o seu reino, o sultão Ahmad al-Mansur Saadi voltou sua atenção para o Império Songhai onde cobiçou apoderar-se das fabulosas minas de ouro.

A 30 de outubro de 1590, uma coluna marroquina composta de 3.000 a 4.000 soldados, acompanhados de várias centenas de auxiliares, uma expedição de apoio de 8.000 camelos, 1.000 cavalos de carga e 600 trabalhadores. Levaram também oito canhões ingleses. O exército deixou Marrakech sob o comando do paxá Djūdar. Transpôs o Alto‑Atlas, depois desceu ao vale do Dar`a até o país Ktawa, donde penetrou no Saara. No fim de uma marcha forçada de sessenta dias, a armada marroquina chegou às margens do Níger a primeiro de março de 1591 e, onze dias depois, atingiu Tondibi, a uns 50 km penas da capital Songhai, Gao.

 

Askia Muhamad esperou até o último momento para mobillizar suas tropas. Ele pôde contudo arregimentar uma força considerável contra o invasor, mas, frente às armas de fogo marroquinas, as tropas Songhai foram esmagadas, após um dia de resistência heroica, em 12 de março de 1591. Assim ruía o último grande império saeliano, cujos soberanos, inteiramente absorvidos por suas querelas internas, não tinham prestado a atenção exigida às ameaças marroquinas. O sultão de Marrocos, Ahmed el-Mansur, estabeleceu-se em Tombuctu e aniquilou completamente o império.

 

Desde a queda do grande askiya Muhammad al‑Hādjdj, em 1529, a corte de Gao tinha‑se, com efeito, tornado palco de lutas implacáveis entre os diversos pretendentes ao trono, as quais rapidamente se transformavam em sedições a minarem a estrutura do império. É assim que, apenas cinco anos antes da invasão marroquina, o Império Songhai foi praticamente dividido em dois, depois da revolta do balama al‑Sadduk, cujo quartel‑general estava em Tombuctu.

A sedição foi certamente sufocada por Ishāķ II, mas, por falta de tempo, ele não teve quase nenhuma possibilidade de restabelecer a unidade do país.

No plano econômico, o Songhai sofria há vários decênios os efeitos de uma conjuntura marcada por incidências negativas do comércio português em seu litoral. Aliás, os reveses militares em Dendi, em Borgu e no país Mossi – reservas tradicionais de escravos do Império –, bem como a perda de Taghāza em 1585, tornavam mais agudas as consequências sociais dessas convulsões conjunturais que vinham agravar as calamidades naturais de toda a espécie – epidemias, seca,carestia.

 

Em seus últimos dias, o Império, vasto conjunto territorial, construído por Sonni ‘Ali e o askiya Muhammad, não dispunha de uma estrutura étnica e sociocultural que já tivesse conferido uma unidade maior a seus grandes predecessores na região, Gana e Mali: os songhai não tinham podido constituir, na verdade, um elo de união entre os diferentes povos que formavam o Império.

Seu peso era sobremaneira fraco sob o grande askiya Muhammad, mais próximo dos valores árabo‑ berberes de Tombuctu do que da tradição de Gao e de Kūkya (Koukya), da qual era estranho de nascença. Capital política, evidentemente, Gao, tampouco o interior Songhai propriamente dito, não eram o motor do Império, cujo centro de gravidade se encontrava paradoxalmente em território conquistado, em Tombuctu e em Djenné.

O Império Songhai desmoronou e nunca mais se ergueu. No entanto, o Marrocos mostrou-se incapaz de exercer um controle firme sobre a área devido à vastidão dos domínios Sonhai e às dificuldades de comunicação. Uma década de combates esporádicos começou e o território acabou se dividindo em dezenas de reinos menores. Os Songhai sobreviventes estabeleceram o Reino Dendi que perduraria até que os colonizadores franceses o conquistassem em 1901. O Songhai ainda perdura nas tradições e na língua, hoje falada por três milhões de pessoas.

 

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